sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Como "escapar" dos conflitos interiores ?

Sou estudante de Filosofia e Astrologia, passo a vida com grandes questões na cabeça e consigo sempre dar bons conselhos aos outros mais que a mim mesmo. 

Como não defini propriamente a minha carreira até agora, sinto-me em constante luta comigo próprio e principalmente com o mundo, qual Atlas com o mundo as costas... Sinto-me muitas vezes preso e profundamente melancólico. 

Como arranjar vias de escape para me poder "mexer" à vontade 
e resolver a ferida do meu Quíron? 

José, Lisboa

Adaptado de Astrodienst
Esta questão lembrou-me dum fenómeno que acontece muitas vezes (sempre?) com aqueles de nós que se dedicam à Astrologia. O nosso objetivo principal é perceber quem somos, como funcionamos. Estudamos o nosso Mapa Astrológico à exaustão, se preciso for. Mas ainda assim, por mais avançado que seja o nosso conhecimento teórico, acabamos sempre com uma visão limitada, enviesada do nosso próprio Mapa. Afinal, como poderia assim não ser? Quando olhamos o nosso reflexo no espelho, não vemos o que os outros vêm, mas sim aquilo que estamos predispostos a reconhecer - as rugas, o nariz esquisito, os cabelos brancos, ou o sorriso espetacular, o olhar brilhante, o estilo impecável.

E é por isso que astrólogos procuram astrólogos. Como diz o ditado, "em casa de ferreiro, espeto de pau". Ter o nosso Mapa analisado por outra pessoa é como se tivéssemos passado imenso tempo a olhar para uma estátua, sempre da mesma posição: quando já quase nos convencemos que pouco mais há para saber, chega alguém que diz "Mexe-te um pouquinho da tua visão cristalizada e olha para isto de outro ângulo, de outra perspetiva". De repente, descobrimos o que até agora nos era inacessível pelo nosso próprio preconceito. O nosso Mapa Astrológico, aquele "velho amigo" que sempre acompanhou os nossos estudos, revela agora novas facetas, novas camadas de significados complexos e inexplorados.

Serve isto tudo para dizer que, quando olhei para o seu Mapa, vi muito mais do que aquilo que apontou no e-mail. Todos os conflitos interiores sugeridos no Mapa contêm, em si mesmos, propostas de solução. Porque para cada aspeto de tensão (quadratura ou oposição) encontramos um aspeto de harmonia (trígono ou sextil) que ajuda a descobrir soluções, caminhos, possibilidades de avanço construtivo pela vida fora.

Voltando à sua questão, é muito natural que se sinta melancólico, preso às suas circunstâncias e indefinições. O momento atual pede-lhe uma grande dose de solidão, de mergulho nas suas profundezas conscientes e até inconscientes para compreender de que matéria é feito. Para resgatar a sua auto-suficiência, a sua resiliência emocional, aquela certeza primitiva de que é capaz de sobreviver a tudo - até mesmo a "carregar o mundo nas costas" (o trígono Plutão-Lua está a ser ativado, via sextis, pelo trânsito atual de Plutão em Capricórnio). 



Esta reflexão é fundamental para lhe dar a sustentação interior de que precisa quando tenta avançar na sua vida profissional. O mais provável é que não tenha um rumo profissional convencional nem nada que se lhe pareça: Quíron conjunto ao MC é mesmo assim... Não é suposto "resolver" a ferida emocional que Quíron representa, e que no seu caso diz respeito a sentir-se digno de amor, de carinho, de cuidado, de proteção. Mas isso não significa que deva resignar-se, antes pelo contrário! Tudo o que não puder fazer por si, fá-lo-á pelos outros. Para tal, será útil canalizar os seus talentos empáticos e artísticos (Lua em Peixes na Casa 5) e o enorme poder pessoal para lidar com os seus recursos, sejam materiais ou não (Plutão em Escorpião na Casa 2, que forma um grande trígono com a Lua e Quíron).

No mundo ideal, você consegue brilhar social e profissionalmente pelo seu cuidado com os outro mas também pelo modo carismático como expressa as suas ideias (Sol em Caranguejo, Mercúrio em Leão, ambos na Casa 10). Este é um dom extraordinário, o de inspirar os outros a viver a sua Criança Interior - uma mistura de carpe diem (Leão) com aconchego e proteção (Caranguejo). Mas este propósito luminoso precisa reconciliar-se (porque está no topo de um Yod) com o fardo que você sente que carrega, o seu lado ultra-responsável e que parece disposto a tomar para si mesmo todas as dores do mundo (o tal stellium em Capricórnio). E reconciliar-se também com a sua tremenda sensibilidade, com as suas emoções à flor-da-pele que o fazem sofrer o sofrimento dos outros, sem julgamento e sem defesas (Lua em Peixes). 

Claro está que muito mais haveria para analisar. Mas o essencial é isto: você está a ser chamado para "acordar", para reconhecer que pode e deve ter um papel importante na transformação do mundo lá fora, que pode e deve tornar-se responsável pelas suas ideias de solidariedade e renovação social ainda que isso não se traduza numa carreira convencional e deixe bastante expostas as suas emoções, os seus instintos. A sua ferida quirónica e as suas lutas internas não vão desaparecer, nem é suposto: encare-as como um combustível, uma razão para nunca deixar de tentar mais e melhor, um dom (de amor, de criatividade) que pode e deve colocar ao serviço dos outros, em vez de uma "maldição" que deve carregar penosamente pela vida fora. Honramos as nossas feridas emocionais quando encontramos uma forma de aliviar nos outros aquilo que nos dói em nós.

Ou como escreveu Nietzsche, é preciso ter caos dentro de nós para fazer nascer uma estrela que dança.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Amor no Estrangeiro ?

Tenho chance de me casar com uma pessoa estrangeira? Pergunto isso porque sempre gostei de coisas estrangeiras, e acho que me relacionar com alguém de ''longe'' seria uma coisa bem legal. 
Lucas, RS (Brasil)

Adaptado de Astrodienst

O estrangeiro exerce um fascínio especial em muitas pessoas. É o chamamento para descobrir algo de novo e estimulante, qualquer coisa que amplia os nossos horizontes, que nos convida a novas experiências e nos pôe em contacto com novos conhecimentos, outras perspetivas do mundo e da vida.

No mapa astrológico, é a Casa 9 que mostra o nosso olhar sobre o mundo lá fora. Será uma terra de oportunidades? De sacríficios? De descobertas? Ou de ameaças? 

No seu caso, Lucas, encontramos uma visão bastante utilitária do estrangeiro (Casa 9 em Virgem). Prudência e muito sentido crítico não fazem antever um grande desejo por viagens, ou por conhecer pessoas de outras culturas. Esse grande desejo, encontramo-lo afinal na Casa 12, aquela que mostra as nossas experiências fora da realidade habitual. Aqui, o apelo para expandir horizontes é muito forte (Lua em Sagitário), e desafia o seu poder de conquista sexual que assenta muito no estímulo intelectual, nas conversas intermináveis cheias de sentido de humor (Lua oposta a Marte que está em Gémeos, na Casa 5).

Assim, mais do que uma pessoa estrangeira, você quase anseia por uma "realidade alternativa". Por um relacionamento com grande riqueza emocional (o Sol está em Caranguejo na Casa 7, a dos relacionamentos) com alguém que o incentive a ir tão longe quanto desejar, não só em termos culturais e filosóficos mas também em termos românticos, afetivos. Assim, não se limite a procurar apenas estrangeiros, mas procure também pessoas que não são convencionais, pessoas artísticas, imaginativas, espiritualmente conectadas a um poder superior. E tenha em atenção o seu sentido crítico: pode ser útil para manter algum controlo sobre o seu poderoso lado emocional (sobretudo quando você se envolve com outras pessoas), mas pode também ser demasiado discriminatório, afastando-o das outras pessoas por terem certos "defeitos".

Para finalizar, adianto-lhe daqui até ao final do próximo ano terá excelentes oportunidades de conhecer pessoas interessantes - estrangeiros ou não. Esteja atento a quem se cruza no seu caminho e aproveite!

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Ensinar: Vocação ou Prisão?

Como posso ter Quíron em Gêmeos na Casa 9 e ter escolhido ser professora? 
Odeio essa profissão e não vejo a hora de sair dela. 
Agora, ao mesmo tempo que sou professora de português, busco o caminho da terapia floral e atuo também como terapeuta para futuramente ter condições financeiras de sair desta prisão do magistério. 
Eu só quero ser feliz.

Tatiana, RJ

Adaptado de Astrodienst
Todos temos talentos que expressamos com facilidade, com naturalidade, e mesmo com muito prazer. Da mesma forma, existem em nós dificuldades, debilidades, limitações inatas, feridas emocionais cuja cura parece impossível.

Cada pessoa se define, até certo ponto, pelo modo como escolhe lidar com esses "pontos fracos". E aqui o verbo essencial é mesmo escolher: tenhamos maior ou menor consciência disso, somos nós que decidimos de que forma vamos lidar com aquilo que nos causa dor ou medo. Varrer pra debaixo do tapete? Esconder no armário? Falar com um amigo? Com um psicoterapeuta? Deitar as culpas para cima dos outros? Dizer que é azar, karma, destino...? Ou encontrar uma profissão que nos obrigue a lidar com isso, dia após dia após dia? Escolher o que fazer é da nossa inteira responsabilidade individual, por muito ou pouco informada que seja essa decisão. 

Neste Mapa Astrológico encontramos a "semente" de uma pessoa inteligente, criativa, extrovertida, positiva e auto-motivada, que adora brilhar e expandir os seus horizontes mas que tem ao mesmo tempo um lado sério, reservado, responsável e intensamente emocional, profundamente empenhado em ser a melhor versão possível de si mesmo.

E no meio de tudo isto, eis que surge Quíron, o misterioso "curandeiro ferido", em grande destaque. 

Quíron em Gémeos
Sei, sinto, acredito no fundo de mim mesma que não sou inteligente. Doi-me a minha capacidade de aprender, de comunicar, e ao mesmo tempo sinto uma ânsia tremenda de adquirir informação, de estar em contacto - mesmo que nada do que eu faça sirva para apaziguar esta dor.

Como que observando distanciadamente todos os planetas do outro lado do Mapa, esta "ferida incurável" interfere diretamente com os relacionamentos (Vénus), com a capacidade intelectual (Mercúrio) e com a satisfação das necessidades emocionais mais elementares (a Lua).

Comecei a análise do Mapa com o adjetivo "inteligente" porque este Quíron pede clareza de ideias. Mas a inteligência que aqui surge refletida não é uma inteligência convencional: 

- O Ascendente Libra sugere uma abordagem lúcida e lógica de qualquer situação.

Mercúrio está em Virgem: pensamento super-analítico, super-analítico! Na Casa 12, precisa de isolar-se do quotidiano de vez em quando e vaguear um pouco pelo reino do sonho e da imaginação - mas o poder de observação e de raciocínio está lá. E em estreita colaboração criativa (sextil) com Saturno em Escorpião - que lhe dá um radar investigativo para aprofundar a análise de qualquer questão, por mais incómoda ou traumática que seja.

- A Lua em Sagitário, juntinho a Urano retrógrado na Casa 3. Este é um elemento determinante daquilo a que chamaria "inteligência não-convencional": uma intuição apuradíssima, quase clarividente, que lhe permite saber instintivamente e prematuramente muitas coisas a que um normal esforço mental não teria acesso. Este acesso quase sobrenatural a um conhecimento que está muito para além de qualquer análise racional manifesta-se na forma como você comunica e aprende com as outras pessoas.



Estes três fatores já servem para demonstrar que você é, de fato, uma pessoa inteligente. A razão porque se tornou professora? Talvez para provar a si mesma que é inteligente. Que é capaz de dominar o reino de Gémeos onde o seu Quíron a faz sentir tão vulnerável. Outras pessoas decidiriam fugir de tudo isso - não aprender, não ensinar. Você, decidiu o contrário. Enfrentar o desafio, por muito que lhe custe. É que não se trata apenas de transmitir informação. Com Quíron na Casa 9, você precisa de sentir que consegue inspirar e guiar outras pessoas na sua própria expansão de horizontes intelectuais. E com o Nodo Ascendente em conjunção a Quíron, esse desígno torna-se ainda mais importante: representa um desafio essencial na sua evolução pessoal, em que cada conquista lhe traz profunda satisfação pessoal e convicção de que mais um obstáculo foi ultrapassado com sucesso.

Você tem dentro de si um mestre (Lua-Urano) e um discípulo (Quíron), em simultâneo. Pode às vezes parecer que são incompatíveis, que as suas "batalhas quirónicas" não lhe trazem bem-estar, segurança emocional, paz interior. Mas é provável que o magistério tenha sido uma etapa essencial ao desenvolvimento dos seus talentos quirónicos, que agora pretende colocar ao serviço das outras pessoas. De certa forma, vai continuar ensinando e aprendendo, só que num nível diferente. 

Até isso acontecer, pergunte-se de que forma pode levar a sua Lua-Urano para a sala de aula. Como pode tornar a sua abordagem ao ensino mais criativa, mais estimulante e aprazível para si e para os seus alunos, muito mais inovadora e democrática com os talentos e as capacidades de cada um deles, individualmente. E, já agora, cuide também do seu Sol - que ele é um menino positivamente mimado! :-) Partilhe tudo o que a apaixona com outras pessoas que sintam o mesmo, permita-se brilhar e ser admirada por aqueles que entendem a sua visão, a sua paixão. 

Afinal, a sua viagem ainda agora começou.

domingo, 16 de junho de 2013

Que Inferno é o seu?

Às vezes temos a certeza de que o Inferno existe mesmo. Não como um lugar mítico para onde se exilam as almas pesadas de tanto pecar, ou como algum conceito teológico utilizado como arma contra a falta de fé num Deus institucional. O Inferno existe em muitos infernos e inferninhos, aqui mesmo na Terra, e está abundantemente disperso por todo o lado.

A minha definição de Inferno seria a de uma experiência ou estado de espírito envolvendo grande sofrimento, e do qual aparentemente não somos capazes de sair. A parte do "sem fuga possível" é importante, pois se fosse fácil escapar não seria o Inferno, apenas uma  inconveniência temporária. Quanto ao conceito de "grande sofrimento", cada cabeça sua sentença. Ficar preso no trânsito é o inferno dos impacientes, ser rejeitado o inferno dos apaixonados, perder para a Morte alguém que se ama o inferno de todo o ser humano em alguns momentos da sua vida.

Outros infernos não são situações ou circunstâncias, mas antes emoções e pensamentos em circuito fechado que povoam muita da nossa atenção consciente. O não saber perdoar, não conseguir esquecer, não parar de enciumar, não vencer a inveja, não deixar o rancor. Estes são infernos muito pessoais, partilhados apenas com quem nos está mais próximo e cuja compreensão nos possa oferecer algum tipo de alívio, ainda que temporário. 

No fundo, até sabemos que a entrega às labaredas da auto-comiseração é voluntária. Mas sejamos francos: as emoções negativas podem ser tão viciantes como as positivas. E quando esse vício se torna verdadeiramente incontrolável, não resistimos a propagá-lo. Como sereias malévolas ou demónios da encruzilhada (escolha você a mitologia que prefere ;-), atraimos todos os que apanhamos no nosso raio de acção para connosco multiplicarem o inferno em que vivemos. Controlamos, manipulamos, torturamos psicologica e emocionalmente. Nascem assim os infernos a dois, a três ou a mais.

E quando os infernos interiores são tão intensos no sofrimento que provocam e na capacidade de contágio que têm, apoderam-se de lugares reais. Encontramo-los em casas de família e em locais de trabalho. Fogueiras colectivas onde a mente e o coração dos incautos é aprisionado - muitas vezes por inconsciência, mas sempre com o seu consentimento.


O mapa astrológico mostra-nos a natureza das nossas maiores aprendizagens e em que áreas da vida surgirão mais oportunidades de aprender. Às vezes essa slições serão agradáveis, até extasiantes. Mas noutras alturas só mesmo um inferno ou dois farão desenvolver em nós a força e a resiliência necessárias para dar um significativo salto em frente. Porque só encarando o Inferno poderemos discernir nas suas labaredas os ecos dos nossos conflitos interiores, e quem sabe (com um pouco de lucidez) encontrar a melhor forma de ultrapassar esses conflitos.  
Aprendizagens difíceis, mas necessárias. Primeira etapa: Reconhecer que o inferno em que estamos há-de servir para alguma coisa - encontrar um propósito. Segunda etapa: Perceber o que aquele inferno em particular nos diz sobre quem somos - discernir um fio condutor no meio do caos emocional. Terceira etapa: Decidir sobre a continuidade do inferno - seguir o fio condutor sem receio do que nos espera no final, ou permanecer impávido e impotente, agrilhoado por vontade própria.

Ah, quando conseguimos fugir de um inferno... Não há sensação comparável. É mais do que alívio, é libertação. Chega dessa aula interminável (e inflamável!), passemos a experiências novas, não importa se boas ou más! Dedicamos um pouco de compaixão pelos que ainda lá ficaram, pelos que ainda não descobriram que podem fugir, mas nada mais podemos fazer. Não nos compete definir, rotular ou julgar os infernos dos outros, muito menos ditar sentenças de quem deve salvar-se e quando. A cada um, o seu inferno, a sua aprendizagem, a sua responsabilidade por ficar ou partir.

"Se estiveres a passar pelo Inferno, continua a andar."
Sir Winston Churchill

terça-feira, 11 de junho de 2013

E hoje, já escutou os "muitos" que você é?

Quando fala de si mesm@ num contexto social, como se apresenta?

Normalmente somos apresentados a novas pessoas pelo nosso nome próprio e pela nossa profissão, mesmo quando não estamos em contexto profissional. Numa conversa mais alargada, podemos dizer que somos pais/mães, tenistas amadores ou membros da associação recreativa lá do bairro. Este tipo de informação faz parte não só do cartão de visita que mostramos ao mundo, mas também do rótulo que aplicamos a nós mesmos: um rótulo com informação diversificada, mas ainda assim um rótulo único, indivisível, minimamente coerente.

Na verdade, a coerência que nos esforçamos por ostentar não reflecte, nem de perto nem de longe, a realidade do que somos. Frases como "chamo-me Zé e prefiro preguiçar ao fim-de-semana em vez de ajudar com as compras da casa" não são aceitáveis como rótulo próprio nem causam boa impressão (mesmo em contexto de flirt pouco eficaz!). Mas nem por isso deixam de reflectir uma parte do que somos.

Nas palavras de Fernando Pessoa, "Eu sou Muitos". 

Se observarmos com alguma distância o nosso próprio comportamento, rapidamente chegamos à conclusão que esses "Muitos" se vão alternando ao longo do dia. Às 7h da manhã, sou quem adora preguiçar e se pudesse não trabalharia nem mais um dia...! Às 10h da manhã, sou profissional super-eficiente. À hora do almoço, sou expressiva e cativante num encontro de negócios. Ao final da tarde, sou eremita que anseia por regressar à "caverna". E assim por diante... 

Pelo meio, surgem outros "Muitos" aqui e ali. Sou a colega invejosa que detestou saber da promoção de outro. Sou a empregada submissa que não foi capaz de dizer não ao pedido absurdo do chefe. Sou a mulher insegura que liga para o escritório do marido quando este diz que vai trabalhar até mais tarde. E muitos outros "Muitos" que a maioria de nós prefere varrer para debaixo do tapete. (Imagine-se o ridículo a que estes "cartões de visita" nos exporiam...!)

E no entanto cada um de nós é mesmo Muitos, sem hipótese de a eles fugir. Como um espelho que estivesse partido em vários pedaços. Alguns fragmentos são maiores, ocupam o "lugar do condutor" do nosso ego durante mais tempo. Outros são mais pequenos, representam aqueles rasgos imprevisíveis que lá muito de vez em quando nos assaltam ("Chiça! Nem parecias tu!"). Mas a distinção mais importante será a que fazemos quanto ao reflexo que nos devolve cada fragmento: algumas partes do espelho são luminosas, mostram-nos como gostaríamos de ser o tempo todo; outras partes são escuras e sujas, nelas vemo-nos feios e esquisitos, preferíamos que não existissem. Então colamos os fragmentos de que mais gostamos (os maiores e mais luminosos), e tentamos esquecer que os restantes existem.
Astrologicamente, encontramos os diferentes "pedaços" de quem nascemos para ser representados nos planetas do nosso mapa de nascimento. Imagine que cada pedaço-planeta era uma pessoa, e que todas estas pessoas estão reunidas em permanência, algures dentro de si, para determinar os seus objectivos, as suas emoções, os seus recursos..., e como você se vai comportar em cada segundo que passa. 
O Sol é o moderador da reunião, a Lua a anfitriã, Mercúrio o estratega, Vénus a diplomata, Marte o lutador, Júpiter o empreendedor, Saturno o velho do restelo, Quíron o transgressor ferido, Urano o génio excêntrico, Neptuno o romântico sonhador e Plutão o poderoso obscuro. 
O signo em que cada planeta se encontra mostra como ele desempenha o seu papel: Mercúrio em Virgem é um estratega que se preocupa com os detalhes, Mercúrio em Sagitário será um estratega que olha em primeiro lugar para o significado maior do plano. E os aspectos entre os planetas (os ângulos entre as suas posições) reflectem a natureza da sua interacção. Marte pode ser um excelente braço-direito do Sol, ou um rufia que tenta impor-se na reunião desafiando a autoridade do moderador.

E assim a análise de uma mapa astrológico ganha vida, e assiste-se em cada pessoa a uma peça de teatro original, complexa, interminável. Começa-se a compreender os Muitos de que é feita aquela pessoa, como esses Muitos interagem entre si e de que forma seria possível tornar as suas reuniões mais harmoniosas, mais produtivas. Afinal, quem quer ter um planeta amuado dentro de si, conspirando e sabotando porque foi rejeitado e não sabe de que outro modo actuar para ser escutado e integrado...? 

Porque o espelho de quem somos buscará sempre o retorno à forma integral, completa. Para que isso aconteça, todos os pedaços devem ser incluídos - mesmo aqueles que à partida parecem "estragar" a nossa auto-imagem. Os Muitos que somos - e os planetas que os representam - anseiam por uma espécie de esquizofrenia democrática em que todos têm voz, todos oferecem algo ao debate, e o produto final reflecte o consenso da maioria sem abafar as legítimas necessidades de ninguém. 

Se somos Muitos, tenhamos a autenticidade de os sermos Todos.

Se faço estas análises de um modo lasso e casual, não é senão porque assim retrato mais o que sou. 
De uma análise propriamente profunda não só sou incapaz, mas sou também artista demais para a pensar em fazer; pensar em fazê-la seria pensar em dar de mim a ideia de que sou uma criatura disciplinada e coerente, quando o que sou é um analisador disperso e subtilmente desconcentrado. 
A minha arte é ser eu. Eu sou muitos. Mas, com o ser muitos, sou muitos em fluidez e imprecisão. 
Fernando Pessoa, in 'Reflexões Pessoais (1930)'

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Sonho de um Dia Perfeito

Já imaginou o seu dia perfeito? Se pudesse passar um dia eterno a fazer qualquer coisa, o que seria? Chegar ao topo do Everest? Vencer um Grande Prémio de Fórmula 1? Talvez algo mais simples, como nadar no mar ou desfrutar de um picnic com os amigos numa fantástica tarde de sol...

As hipóteses são muitas, tão individuais como cada pessoa é única, mas comum a todos os "dias perfeitos" seria a emoção de nos sentirmos VIVOS, realizados, profundamente felizes. 

Sou especial e os deuses sorriem-me no meu dia perfeito.
Tudo o que eu tenho de mais autêntico, vibrante e criativo é-me devolvido pelo mundo inteiro no meu dia perfeito. 

O Sol no Tarot
Universal Rider-Waite
Astrologicamente, a ideia de um "dia perfeito" surge associada à casa V, ao signo associado que é Leão e ao respectivo regente, o Sol. Podemos encontrar a nossa Criança Interior na casa V do mapa astrológico, no signo onde essa casa começa e nos planetas que aí possam estar. Para quem tenha filhos ou queira vir a ter, a casa V reflecte o que esse(s) filho(s) representam para nós, como os vemos e nos relacionamos com eles, e de que forma eles nos inspiram a expressar a nossa própria criatividade.

Quem conhece o Tarot sabe que o Arcano Maior do Sol é muitas vezes representado por uma ou duas crianças sorridentes, brincando num jardim resplandescente de luz. Esta é a imagem que sempre associo à casa V, pois esta é a casa da pura diversão, da alegria imensa que há para descobrir num perfeito dia de Sol. 

No dia perfeito que imaginámos, não somos exactamente nós, adultos responsáveis e cheios de coisas para fazer, que lá estão a divertir-se. É a nossa Criança Interior, a criança que um dia fomos e a Criança que sempre seremos. Aquela parte de nós que sabe que é especial, que sabe que é feita da mesma matéria de que são feitas as estrelas e os cometas. Aquela parte de nós que brilha com luz própria, que é inocência e pura alegria ao mesmo tempo. 

É esta parte de nós que se apaixona perdidamente, que é capaz de criar inspirada e inspiradoramente, que traz ao mundo um pouco da centelha divina para que o mundo se admire, e maravilhe, e se torne infinitamente melhor por isso. Esta é a parte de nós que vive o eterno dia perfeito. 

De que serve viver sem paixão? Olhando a casa V podemos (re)descobrir o que nos faz mesmo vibrar, e que incessantemente procuramos (mesmo sem nos darmos conta) nas outras pessoas, ou nas actividades profissionais, ou (frequentemente) nos filhos e sobrinhos em quem projectamos a nossa Criança Interior, e que esperamos que a vivam por nós - já que "ainda" são jovens e ingénuos, que nós já estamos "velhos para certas coisas..."

Criatividade é uma das palavras-chave da casa V, e muitas vezes a expressão mais fiel da nossa Criança Interior surge nos hobbies que nos mantêm ocupados durante horas a fio. Há hobbies muito comuns, outros que pouca gente entenderá (coleccionas latas? com essa idade?). Mas independentemente da sua natureza, os hobbies são como pedaços do nosso dia perfeito que tentamos encaixar num quotidiano mais ou menos desapaixonado. 

E que dizer da paixão à primeira vista (ou à segunda ou à vigésima), que nos tira o chão e nos leva às nuvens sem pedir licença...? Danem-se as convenções sociais, a responsabilidade e até a timidez, pois que se vai esgotar o ar respirável se aquele anjo na Terra por quem perdemos o juízo não nos der um vislumbre do dia perfeito com o seu sorriso....

Por mais que estejamos presos aos deveres da "adultice", todos merecemos viver em pleno a nossa Criança Interior. Deixá-la brincar em liberdade, levá-la a passear pelas coisas que a apaixonam, sentir a profunda alegria de ser imortal por um dia. Durante as horas em que voltamos à infância para brincar aos índios e caubóis com o nosso filho. Durante os minutos em que nos sentimos especiais por mostrarmos aos outros o quão especiais eles são. Durante os breves instantes em que uma ideia genial nos atinge como um raio, e o coração bate furiosamente depressa, mobilizando-nos para dar corpo e alma a uma tela vazia, a um piano silencioso ou a um velho móvel esquecido no sótão.

Sem o sonho de um dia perfeito, a realidade torna-se insuportável. Precisamos de paixão nas nossas vidas - ou pelo menos da promessa de paixão. Porque até a simples promessa, o vislumbre, o sonho, já contêm uma tonelada de paixão avassaladora, temperada com uns pozinhos de centelha divina e pronta a ser libertada no mundo ao mínimo sinal de que o dia será, de facto, perfeito. 

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Rotinas & Rituais

A maior parte dos nossos dias tem uma cadência previsível. Com muitas possíveis variações, essa cadência inclui sono e vigília, comer e tomar banho, trabalho e repouso. A rotina é alvo frequente de queixume geral - diz que abafa a criatividade, mina a espontaneidade, arrefece a paixão e até causa indigestão se ousamos experimentar algum pitéu mais arrojado. 

Mas se o ter rotinas é algo tão vulgar no comportamento humano, é porque elas são absolutamente necessárias. Em primeiro lugar, há algo de profundamente reconfortante em tudo o que é previsível e ritualístico. Por um lado, sabemos quando e como vai ocorrer aquele pedacinho do nosso dia (é previsível). Depois, estamos lá nós a assistir ao pedacinho, ou a fazer acontecê-lo. É uma espécie de ordem premeditada que nos torna produtivos e eficientes.

E não é por acaso. Qualquer organismo vivo se constroi sobre rotinas. A das reacções bioquímicas ao nível da célula, da multiplicação e morte das células, dos órgãos em perfeita sintonia de funções uns com os outros... Pois se até o batimento cardíaco obedece à rotina de um ritmo...! Em termos estritamente biológicos, a vida não é possível sem uma grande dose de previsibilidade - afinal, o que são as células cancerígenas senão entidades demasiado "espontâneas"...? 

Astrologicamente, a nossa relação com a rotina pode ser analisada a partir da casa VI do mapa astrológico. O signo onde começa esta casa e os planetas que aí estão mostram o grau de rigidez das nossas rotinas, de que modo nos organizamos e como funcionamos em organizações hierarquizadas (principalmente o local de trabalho). Com afinidade natural pelo signo de Virgem, a casa VI reflecte também o relacionamento que temos com a saúde, com o bom ritmo das rotinas do nosso organismo. E de uma forma mais abrangente indica como aperfeiçoamos a nossa capacidade de actuar com eficácia e utilidade no mundo real - ou seja, o nosso trabalho.

Foi Carl Jung quem há muito tempo argumento que o mundo da matéria (Terra) estaria naturalmente oposto ao mundo da intuição (Fogo) - ou pelo menos a nossa percepção humana assim os colocaria, em extremos opostos. A velha discussão entre rotina e criatividade é um bom exemplo deste aparente conflito. Afinal, qualquer pessoa sentirá que quanto mais sobrecarregada é a sua rotina, quanto mais se vê forçada a cumprir horários e tarefas, menos disponibilidade mental e emocional tem para expressar o seu lado criativo, intuitivo, espiritual. 

E assim passamos pesados dias a fio, como se o fardo das nossas responsabilidades quase nos enterrasse a cada passo que damos no fiel cumprimento das rotinas que atribuimos a nós mesmos. Alguns sentirão mais do que outros a falta de espaço/tempo para ser espontâneo, para não ter de seguir nenhum roteiro predefinido e obedecer apenas ao impulso do momento. Mas parece-me que, consciente ou inconscientemente, todos sentimos falta disso, nem que seja uma vez por dia.

É nessa altura que, desviando-nos do que quer que estávamos a fazer, acabamos por ir parar ao e-mail, ao Facebook ou ao YouTube, ou em frente à TV a ver uma ficção qualquer. A nossa sede de criatividade leva-nos a fugir de rotinas demasiado sobrecarregadas. Não que os nossos destinos de escape sejam fonte de esfusiante êxtase, antes pelo contrário. Adormecem, anestesiam, fazem com que a rotina se torne um pouco menos penosa, um pouco mais suportável. 

Nada de mal nisso. Mas porque não conciliar rotina e criatividade? Afinal, sem rotina não há como tornar real o impulso criativo, e sem criatividade a rotina torna-se estéril, auto-limitada. Olhando mais profundamente o signo de Virgem, encontramos o conceito de "ritual", e ritual não é apenas uma coisa que se faz repetidamente, previsivelmente. Não é mais uma rotina. Ritual é qualquer coisa de sagrado. São gestos simples que trazem a nossa consciência para o momento presente, resgatando-a de arrependimentos passados (ai que me esqueci de ir à lavandaria!) ou de preocupações futuras (ai que ainda tenho de passar no supermercado!). 

Enquanto vivemos apenas o momento presente, assistimos à presença de qualquer coisa transcendente no plano material. Escovar os dentes não é apenas escovar os dentes: é sentir a escova nas gengivas, o sabor do dentífrico nas papilas gustativas, a mão que segura a escova e os músculos do braço que se contraem para realizar os movimentos necessários à escovagem. Que milagre, existir tal coisa como papilas gustativas, e músculos, e gel dentífrico. E que eficiência todo este ritual demonstra em obter dentes mais limpos. Mais sãos. 

Se o Universo tende a gerar caos (interpretação criativa da 2ª Lei da Termodinâmica ;-), nada existe de banal no acto de criar ordem, muito pelo contrário. Rotina, saúde, organização, trabalho... são tudo expressões de um ritual muito especial, que é o de trazer ao plano material os inspirados impulsos que nos dá a nossa criatividade. Dar-lhes forma, estrutura, ordem. À nossa maneira (leia-se "escala") somos todos como pequenos deuses, intervindo em cada instante para aperfeiçoar aquilo que já existe ao mesmo tempo que criamos algo de novo. 

Experimente então transformar algumas das suas tarefas diárias em momentos solenes. Só por um instante, concentre-se apenas no que está a fazer. Ligue os seus cinco sentidos à finalidade da tarefa (este gesto de escovar os dentes vai tornar o meu corpo mais limpo, mais saudável). E no final, sinta-se grato por ter dedicado o seu esforço a um Universo mais ordenado. O Universo, certamente, agradece-lhe. 

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Entre 8 Paredes: da Privacidade à Intimidade

Há algum tempo assisti a um programa de TV onde se discutia se e quando deve um casal começar a partilhar os seus momentos de... expulsão de gases intestinais (chamemos-lhe assim). Entre muitas e variadas opiniões, algumas pessoas defendiam a inviolabilidade do espaço nasal e auditivo do parceiro, afirmando ser uma questão fundamental de respeito mútuo a não emissão de substâncias gasosas de origem digestiva, com ou sem ruído associado.

Freud teria por certo interessantes bitaites e soundbytes a adicionar a esta questão, que   tem muito mais significado implícito do que meros ditames de boa educação ou regras de etiqueta conjugal. A mim, fez-me reflectir sobre os conceitos de privacidade e intimidade na esfera dos relacionamentos afectivos. 

No mapa astrológico, a casa VIII mostra o tipo de experiência vivemos quando contactamos intimamente com outra pessoa. O que é isso de "contacto íntimo"? É sexo, claro. Mas também o contacto entre vulnerabilidades, traumas passados, tabus. Neste verdadeiro "quarto de cama" astrológico, deitamo-nos com os esqueletos que costumam estar bem escondidos no armário, com toda a privacidade. E se deixámos alguém entrar? Acabamos por partilhar a cama com essa pessoa, mais os seus esqueletos.

E o inevitável acontece. Descobrem que temos rugas ou celulite, roupa interior desinteressante ou pijamas largos demais, que ressonamos, que nunca repomos o rolo de papel higiénico e que deixamos as peúgas sujas espalhadas pelo chão. Ah, e que temos gases mal-cheirosos.

Tudo isto faz parte do que se chama, sucintamente, a "rotina" do casal. Mas de início nada tem de rotineiro! Queremos agradar, queremos ser a melhor versão de nós mesmos. Que fazer então com todo o conteúdo da casa VIII? Foi lá que guardámos as humilhações da infância, a curiosidade sexual proibida na adolescência, tudo o que sempre nos recriminaram e proibiram, nos fizeram crer que era mau, sujo, imoral. Não deixes tudo desarrumado, não sejas gord@, não sejas porc@, não sejas indecente. E de repente está outra pessoa à porta do nosso quarto, espreitando para dentro, e que fazemos nós? Disfarçamos enquanto for humanamente possível, claro! ;-)

Mas não há intimidade sem partilha integral, verdadeira. E partilhar é, antes de mais, mostrarmo-nos vulneráveis. Aqui me tens, sou assim por dentro. Às vezes um espetáculo tristonho, patético, feio e incorrecto. Outras vezes, nem tanto. Ainda me queres? Ainda me achas dign@ de amor?

Claro que sim! A magia da intimidade é encontrarmos na outra pessoa tudo o que de tristonho, patético, feio e incorrecto tentamos esconder em nós. E por isso não posso evitar olhar com desconfiança para essas teorias que defendem uma "heróica contenção anal" para bem do relacionamento. Sem sangue, suor e lágrimas, vísceras e tudo, de que serve um relacionamento? Que desafios coloca? Que parte profunda de nós comove e transforma?

Desse estimulante tema televisionado, prefiro guardar o exemplo de um casal que celebra toda a demonstração de flatulência com um jocoso comentário humorístico. Estilo "Chiça, que até os sismógrafos em Pequim registaram esse abalo!" É sempre terapêutico usar de um pouco de Ar (leia-se, sentido de humor) para relativizar a importância às vezes exagerada de questões de Água (leia-se, emocionalmente densas). O riso partilhado pode fazer tanto ou mais pela intimidade do casal do que uma tórrida noite de amor. E ajuda a "quebrar o gelo" quando, deitados na cama com os nossos medos, convidamos a entrar o hesitante amante que espreita da porta dizendo-lhe "Queres ser meu cúmplice? Há sempre espaço para mais alguns esqueletos."

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Irmãos (Gémeos ou de qualquer outro signo)

Quando pensamos nas influências decisivas dos nossos anos de crescimento, e o modo como essas influências moldaram os adultos que somos, muitos de nós concentram as suas atenções na relação que tiveram/têm com os seus pais. A relação entre pais e filhos ganhou tal relevo na Psicologia e saberes afins que acabou por chegar à cultura popular actual, onde referências como "mommy issues" ou "daddy issues" servem de metáfora irónica para homens demasiado nostálgicos da comida da mamã ou mulheres em permanente (leia-se "insaciável") busca por um amante mais velho que as controle/proteja.

Mas há outra relação fundamental na nossa "educação para ser humano": o elo que se estabelece entre irmãos. Esta é, provavelmente, a relação mais duradoura que alguma vez teremos, pois começa por volta com o nosso nascimento (ou alguns anos depois) e termina quando morremos (ou alguns anos antes).

De todos os filhos únicos que já conheci, não me recordo de nenhum que não fale, duma forma ou doutra, na solidão que é viver sem irmãos. Nos primeiros anos de vida, é o idílio: centrar as atenções de papá e mamã, não ter de dividir quarto nem brinquedos nem mimos com ninguém. Até que é chegado o momento de dar um passo para fora da esfera eu-no-ninho-do-papá-e-da-mamã. E é nessa altura que damos de caras (ou não) com alguém parecido connosco: um pouco mais velho ou mais novo, a mesma propensão para a brincadeira e para a birra reivindicativa de tudo o que possa ser conquistado dentro do espaço físico e afectivo da família - desde atenção exclusiva a guloseimas.

Astrologicamente, a etapa de explorar intelectualmente o que está para além das fronteiras do ninho está relacionada com o signo de Gémeos (!) e com o planeta que o rege, Mercúrio. Ambos, signo e planeta, simbolizam a experiência de ter irmãos, quer no sentido restrito do termo (irmãos de sangue e/ou de criação), quer no sentido mais vasto - irmãos de idade, de geração, colegas e pares. 

E Gémeos é o primeiro signo de Ar na roda do Zodíaco. Se Ar é conectar, comunicar e relacionar, então o signo dos irmãos é aquele em que encontramos a nossa primeira parceria com alguém que é como nós. O nosso primeiro relacionamento egalitário, chamemos-lhe assim (com os nossos pais nunca nos chegamos a relacionar "de igual para igual", nem mesmo depois na idade adulta).

Talvez por isso a convivência com irmãos desde que se nasce (ou quase) seja uma experiência que não tem comparação com nenhuma outra. Parece que nascemos já programados para amar pai e mãe, mas com os irmãos o amor é um elo que se constroi todos os dias. À custa de rivalidade e de cooperação, de secretismo mas também de grande cumplicidade. E não raras vezes há irmãos que se unem, reivindicando privilégios como se fossem direitos.

Disputas ou alianças fraternais à parte, é com os irmãos que começamos a ter uma visão multifacetada do mundo. Eles instigam-nos a abrir a mente a coisas diferentes, opiniões diferentes. Desafiam-nos a sair do ninho. A aprender a comunicar (de que outra forma poderíamos gritar "Larga esse brinquedo, é MEU?!?!"...?), a lidar com as nossas inseguranças, a testar os nossos limites (de paciência e não só). 

Voltando à Astrologia dos Irmãos, podemos encontrar insights sobre o assunto olhando para a posição de Mercúrio no mapa astrológico, para o signo da casa III e qualquer planeta que aí se encontre. Planetas na casa III mostram frequentemente a forma como vivemos a experiência de ter (ou não ter) irmãos, o que isso representa na nossa vida, e que aspectos da nossa personalidade temos tendência a viver através do(s) nosso(s) irmão(s).  

Um irmão é como um reflexo num espelho que nos devolvesse uma imagem diferente daquela que sabemos que é a nossa. Olhamos e... quem é aquele estranho do lado de lá? Queremos conhecê-lo. Observamos como se mexe, como fala, como se comporta. Às vezes idolatramo-lo, queremos ser como ele. Outras vezes estranhamo-lo, tem defeitos e manias que não entendemos nem reconhecemos em nós. E no entanto estamos ligados a este reflexo para toda a vida.

Porque se mãe há só uma, irmãos podem ser muitos (felizmente), e não precisam ser todos geneticamente aparentados. Na essência do relacionamento fraternal está o respeito mútuo pela diferença de cada um, o desejo genuíno de aceitar o outro como ele é, e a certeza inabalável de que ele estará lá para mim, venha o que vier. Isso sim, é um irmão.


P.S. Este post é dedicado à minha irmã, ilustremente representada no meu mapa astrológico por 3 (!) planetas na casa III: Marte que me instiga a lutar pelo que eu quero, Saturno a relembrar-me dos meus limites e responsabilidades, e Júpiter retrógrado incentivando-me a confiar na minha sabedoria interior sempre que parto à descoberta de novos e melhores horizontes.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Mudar de Casa, Transformar a Vida

O anseio por um lar vive em todos nós... 
um lugar seguro onde possamos existir tal como somos sem sermos questionados.

Maya Angelou (Escritora Norte-Americana)

Mudar de casa é uma experiência pela qual a maioria das pessoas acaba por passar, mais cedo ou mais tarde nas suas vidas. 

Enquanto crianças e adolescentes, navegamos na maré profissional e conjugal dos nossos pais. Nessa fase mudar de casa sinaliza uma alteração importante na estrutura familiar (casamentos, divórcios,...) e também, muitas vezes, na escola que se frequenta e nas amizades que se dissolvem para ver nascer afinidades mais favorecidas pela proximidade geográfica. Na adolescência, a nossa verdadeira casa é o nosso quarto, o refúgio que é mesmo só nosso e onde procuramos solitude para enfrentar as questões do crescimento que nos vão desassossegando a cada instante - ou privacidade para estar com os amigos longe de olhares inquisidores.  

Quando nos tornamos adultos independentes, a mudança para a nossa casa é o primeiro passo no sentido de afirmarmos a nossa auto-suficiência para nós mesmos, para a nossa família, para a comunidade inteira. Não se trata apenas de conseguir pagar as contas, mas de ter autonomia suficiente para lidar com todas as responsabilidades inerentes. E, mais do que isso, é aceitar essas responsabilidades de bom grado, não como um fardo desconfortável (ai a roupa suja, que falta faz aqui a mamã...!) mas como um prémio orgulhosamente conquistado com esforço e maturidade.

E o que significa a nossa casa, o nosso lar? Algumas pessoas encontram aí muita da segurança material de que necessitam - uma casa de Terra. 
Este é o fruto do meu trabalho, a fortaleza onde encontro o conforto, a estabilidade e a organização que me ajudam a lidar com as incertezas do mundo lá fora.
Outros vêem a sua casa como um ninho de emoções - uma casa de Água.
Este é o meu porto de abrigo, onde reúno as pessoas que amo e aprofundo os laços que nos unem, onde partilho os meus sentimentos e deixo que me inundem de emoções alheias.
Haverá quem encare a sua casa como um campo de liberdade mental - uma casa de Ar.
Este é o espaço onde sou livre de dizer o que penso, de deixar as minhas ideias fluir para o papel ou para os ouvidos daqueles que me entendem, de procurar respostas para aquilo que não sei e encontrar no que os outros me dizem uma fonte permanente de novas aprendizagens.
E há ainda quem veja na sua casa um centro de inspiração criativa - uma casa de Fogo.
Este é o aconchego que me aquece, que me anima, que me motiva para conquistar o mundo levando comigo aqueles que me inspiram e fazendo-os sentir-se tão especiais como de facto são.

Por isso, o processo psicológico e emocional de mudar de casa pode ter muitos significados diferentes, ser simples ou complicado, rápido ou demorado, libertador ou aterrador (ou um bocadinho de tudo!) Qualquer que seja a razão objectiva por que tomemos essa decisão (alterações financeiras, familiares, profissionais...), ajuda muito pensar no que constitui de facto a nossa casa, do que fugimos quando nela nos refugiamos e de que forma podemos expandir lentamente as suas fronteiras. 

Para deixar entrar novas pessoas e experiências que nos enriqueçam, para aprendermos a sentir-nos mais confortáveis, mais amados, mais compreendidos e mais inspirados. Para que na nossa pequena casa haja lugar para o mundo inteiro.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Herança de Virgem: Humildade e Integridade

"Começam a fazer algum sentido determinadas situações...
A da ovelha negra faz todo o sentido. Não sei se percebi tudo mas gostei, espero que as minhas filhas que também são Virgens como eu não tenham que viver nada por mim, não quero deixar-lhes esse fardo. 
Não quero saber nada em especial, mas tudo o que me possa dizer...faz sentido?"

Malibu, Coimbra

Adaptado de Astrodienst
Nem todas as heranças familiares são bem-vindas... Mas quer sejamos ou não as ovelhas negras do nosso rebanho familiar, não há como escapar ao legado psicológico e emocional que os nossos pais nos transmitem tal como os seus pais já lho haviam transmitido. E de geração em geração esse legado vai-se transformando lentamente, adquirindo novas características e ultrapassando lições já interiorizadas. 

Quer tomemos essa herança com orgulho ou desdém, certo é que ela está lá, todos os dias. Impossível não vê-la, pois se até quando nos olhamos ao espelho ele nos devolve o cabelo dourado da nossa avó materna, o olhar acutilante do nosso pai ou os lábios finos de um tio distante. 

No mapa astrológico encontramos algumas dicas importantes sobre a relação que desenvolmemos com o nosso legado familiar. Nada nos diz se é bom ou mau: afinal, herdar pomares a perder de vista pode ser a fortuna de um filho e o fardo amaldiçoado de outro. Como sempre, o mapa astrológico mostra o ponto de vista do seu dono (ou dona).

Neste caso, encontramos uma herança emocional em que as capacidades intelectuais são importantes, assim como a comunicação, a permanente aprendizagem. Há um certo desejo de notoriedade social, mas também a necessidade de ser sábio (Sagitário) e não apenas "espertinho" (Gémeos). Talvez esta seja uma família de pessoas inteligentes - sem dúvida que sim -, de pessoas com o desejo de ir mais longe, de expandir os horizontes das suas raízes em busca de um conhecimento mais vasto. Terão tido oportunidade de fazer um curso superior? De viajar, ou até emigrar?

Estas são necessidades importantes, que você absorveu e tomou como suas ainda na infância. Podem reflectir desejos insatisfeitos do seu pai ou da sua mãe, ou podem traduzir sonhos que eles conseguiram mesmo concretizar. Em qualquer dos casos, a busca pelo conhecimento dá sentido à sua vida e ao papel que desempenha no seio da sua família, e deve tentar lembrar-se disso mesmo quando outras preocupações mais mundanas a afastem desta "missão".

Por outro lado, o seu mapa mostra um enorme impulso para se relacionar com as outras pessoas (6 planetas na casa VII, a dos relacionamentos!), e que esses relacionamentos se traduzam em algo de útil, algo que a melhore a si enquanto pessoa capaz de dedicar amor, atenção e cuidado aos outros (porque Sol, Lua, Vénus e Mercúrio estão em Virgem). Há aqui um forte espírito de querer servir, não no sentido depreciativo da palavra mas no seu sentido maior. 
Servir (com S grande) a quem está ao meu lado, tornar a sua vida mais fácil, mais confortável, mas eficiente, mais saudável. Servir com dedicação, com abnegaçao, com humildade. Servir sabendo que isso me torna numa pessoa melhor, mais integrada e sintonizada com a ordem natural das coisas. 

Este espírito de missão está profundamente entrosado com os seus valores morais mas também com valores mais amplos, com causas que importam à sociedade e ao bem comum (porque a confiante Lua Nova está em aspecto a Júpiter, a Neptuno e a Urano). Pode por vezes sentir que os seus sonhos e ideais a distraem de aplicar o seu grande sentido prático. Mas este conflito interior pode ser superado à medida que for interiorizando que são os sonhos e os ideais que nos movem a todos, e que a organização do dia-a-dia se torna perfeitamente estéril quando não há uma causa maior a qual se dedique de corpo e alma.

Quanto às suas filhas, o melhor que lhes pode dar é um bom exemplo. Mostre-lhes como a energia de Virgem faz falta ao mundo, como é necessária para impôr ordem ao caos, para corrigir o que não funciona, para trazer um pouco mais de saúde e pureza à sua realidade e à das pessoas que ama. Viva a sua vida como ela lhe foi destinada, e as suas filhas decerto encontrarão em si um modelo inspirador quando for tempo de tomarem responsabilidade pelas suas próprias escolhas.

Faz sentido? ;-)